terça-feira, maio 25

êxodo

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pronto.

agora sinto tudo essencialmente inacabado.

meu quarto e sala anda apertado, nele não cabe mais o móvel que bombeia o fluxo.

mais embaixo, no hall, faz um frio que se aquece com as voltas dos vaga-lumes que teimam.

o cintilante tom da distância é secundário, pois descobertas de novos mundos sempre causaram revoluções.

sinto a terra em transe sob meus pés cansados de caminhar contra a corrente, e permito-me atingir um meio de caminho.

encontro-te circunstancialmente em minha memória olfativa, tendo a gélida incerteza da presença material.

nesses casos, a matéria pode ser momentaneamente secundária. se tiveres a certeza da fome compartilhada, o banquete será a condição irrevogável.

toma minha pequena persona e cria felizes rearranjos soprados em uma mesma direção. necessariamente àquela que leva ao encontro, sua especialidade.

certo como dois e dois são cinco, me lanço em tua direção.

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quarta-feira, maio 19

do lago

sentir-se só sem ser..
toda a ausência causa caláfrios que aquecem a necessidade do calor compartilhado na banheira vazia e fazem o grande vão parecer eternamente desabitado.

a aurora faz pessoas tão iguais parecerem sombras ensimesmadas.
sentir-se preso num emaranhado de pesoas prontas,
engendra uma realista prece de ateus santificados.
olho os carros no vem-e-vai eloquente e miro um futuro palpável como pinturas rupestres.

a carne mal cozida e desidratada do rosto enrubescido,
lança o peso de uma puberdade leviana sufocada
e faz emergir sonhos fúnebres roubados de si mesmo.

assim, alista-se no exercícito do tempo mal vivido e faz os pequenos meandros da relva interna ganharem a superfície.
tão meus são os seus medos, que torno-me acidentalmente a irrevogável causa deles.

sexta-feira, maio 7

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carícias de flores nos corpos descansados na frondosa varanda. cheiro de café com leite às oito da matina, desperta o olfato para um dia de leituras e bordados. aos domingos, acordo cedo para ouvir as canções que você fez pra mim. à noite, com os óculos na ponta do nariz, olho para o fundo do corredor escuro e repleto de quadros com fotografias daquele que será sempre o meu fotógrafo preferido e penso que o futuro é aqui. agora.
o limão colhido no quintal nos mima suavemente com o melhor suco que já bebemos e que faço pra ti com tanto querer bem, e fica doce mesmo sem o açúcar mascavo, aquele que tanto gostas. uma ode aos documentos perdidos, esquecidos e amarelados pelo tempo que não perdoa, suga o viço e coalha a carne, tornado-a viscosa.
no fim da semana, iremos às compras. geléias, deliciosos e tenros biscoitos, queijos e vinhos. ah.. esses serão secamente consumidos no vão aconchegante, acompanhados por um bom filme, os realizados pelos nossos diretores preferidos e os que nós fizemos (exceto aquele, de que gosto tanto e que você considera piegas demais). lembra da péssima luz naquele dia? como esquecer?! Aquela luz corroborou a imagem maculada que carregaremos por toda a caminhada de vida, desde o fatídico dia de encontro às portas de um café pequeno-burguês freqüentado por gente insossa.
a imagem transfigurada da viagem sem volta..